sexta-feira, 11 de outubro de 2013

* sem título

Nas minhas veias corre sangue que não me pertence. O sangue de alguém por encontrar. Ora, se a mim não me pertence, fá-lo-ei meu.
Ambiguidades para mim as guardo, num plano ortodoxo - quem fui, quem sou e quem não serei.
Alma de pintor sem talento. Escritor que engole as palavras. Uma pedra da calçada solta.

Alvorada

Mil e uma preponderâncias.
Onde o sol se deita, nós acordamos.
No rasgar da alvorada tudo nos pertence.
Sons de sirenes rompem o silêncio enjoativo que se acomodara.
Sons de sirenes e gritos dos aclamados lunáticos ecoam nas ruas citadinas.

Numa cadeira não me assossego. 
Minha alma grita por mil e uma vozes melodicamente irreparáveis.
Na fronteira entre o são e o perdido não nos reconhecemos,
Então apercebe-mo-nos do peso da nossa própria insanidade.
E por mais uma noite gritamos ao som das sirenes.

A alvorada quebra cortinas e muralhas.
O delicioso sabor de algo novo assombra-me o pensamento,
E na alvorada nos retraímos.

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

O que as palavras não dizem

Figuras flamejantes flutuam no ar, afugentando a escuridão ao seu redor. Sombras inquietas e línguas de fogo ardente rastejam, dançando num ritmo exuberante no meio de nenhures, cingidas ao calor acolhedor que me cerca.

Além das chamas alaranjadas, nada se vê. Nada se ouve. Ao longe, a lua repousa inalcançável - uma presença majestosa, adormecida. Quase invejável.
Consegues senti-lo? Que doce silêncio! Silêncio esse, ora, que me apazigua a mente e me embala o espírito, que flui como um rio de palavras obtusas que desagua no âmago da minha dormente consciência.

O mundo observa-me à distância. Aqui sou só eu e a noite, minha eterna companhia. E no fogo falamos, sem nada dizermos. A ti te conto os meus desabafos e ânsias. Os meus desejos e as minhas paixões.

Aqui sou só eu. Sozinho, no meu trono de madeira mergulhado nas fagulhas do meu sol, dou conta de mim e pergunto-me:
Beijar-me-ias esta noite?

segunda-feira, 27 de maio de 2013

No vazio dos teus olhos

Então sentes que o amor te escapa por entre os dedos. Não te pertence. Deixas-te cair com o olhar turvo na continuidade da tua débil existência. Memórias guardadas numa redoma de vidros estilhaçados que espelham figuras uniformes, uma realidade singular do que nunca fora de facto real. Memórias, não. Fantasias. Sonhos longínquos.
Estendes os teus braços, mas não és capaz de os alcançar. Olhas em frente, mas desviam-te o olhar. E sentes-te uma espécie de fantasma.

E nas lágrimas tuas te perdes, sem fôlego nem direcção; esperando por algo novo.
Num movimento de mãos desajeitado limpas as lágrimas do teu rosto, desenhas um sorriso de plástico e vives mais um dia.


A solidão engole-te por inteiro e sentes-te incapaz de fugir.
Dá-me a tua mão, juntos caminharemos na penumbra do silêncio. Onde podemos verdadeiramente ser felizes.